quinta-feira, 22 de janeiro de 2015

Amigos, amigos, Londres a parte

Pela leitura deste blog até onde relatei acho que dá no mínimo pra imaginar como eu estava em frangalhos e teimosa. Muuuuito teimosa para que as coisas dessem certo ou pelo menos eu conseguisse meu FCE.

Para quem tem inglês acima disso parece uma bobeira, mas virou meu foco, minha maneira de lutar ainda por mais tempo (sem dinheiro, sem amigos, sem muitas horas de trabalho) em Londres. Eu não admitia de forma alguma ir embora sem pelo menos esse certificado, era como ter ido à Roma e não ver o Papa (e eu vi quando fui rs o Bento XVI, mas vi rs).
Eu sofria muito e podem ler aqui meus desabafos, mas eu não "largava o osso", eu não jogava a toalha.
Algumas pessoas no Brasil torciam para que eu aguentassem e comentaram quando eu voltei:
"Eu falei pra ele (pro marido) ah, ela vai fazer a merda de voltar!"

É fácil falar que eu ia fazer essa merda quando não se estava vivendo o que vivi: me via encurralada num beco sem saída, escuro e sozinha.

Outra pessoas só me diziam: "Menina, larga tudo e volta! Para de sofrer aí! Volta pras pessoas que te amam!". Mas eu não aceitava isso, era como se eu voltasse totalmente fracassada, mais fracassada do que já me sentia.

As horas de diferença no horário de Brasil e Londres atrapalharam um pouco meu convívio com os amigos que aqui deixei, mas teria que ser assim um pouco para que eu me soltasse em Londres, não?
Tentei fazer amizades e digo que consegui, no final, fazer algumas, mas eu já estava totalmente arredia à Londres, odiando com todas as minhas forças morar lá (sim, eu tive ódio mortal).

Nessa vida louca que vivia de estudar, procurar emprego, levar um monte de desaforo e portas na cara, percebi que alguns amigos no Brasil já haviam cansado de mim. Porque eu imagino que deve ser cansativo dar conselhos pra alguém que sofre, mas não larga o motivo de sofrimento por puro orgulho.
A maioria aguentou bem, mas tive fases ruins com eles porque eu simplesmente estava intransigente, obcecada. E no final sei que também estava fraca para qualquer tipo de amizade: eu não tinha como ser amiga de ninguém porque estava fragilizada demais com tudo que vivia... estava escondendo a verdade numa carapuça: eu estava deprimida, ansiosa e com algum tipo de síndrome, talvez. Não estava me aguentando, não tinha como ter um relacionamento legal com ninguém.

Alguns amigos me aguentaram e me aguentam até hoje. Ouço muito estes porque realmente respeitaram a loucura que eu fazia comigo.

Na minha vida londrina de sofrer e lutar, parecendo quase uma Jack Bauer (rsrs) cheguei a ter problemas com amigos que simplesmente me ignoraram, deram respostas atravessadas e outros que nem esperava briguei de forma agressiva quando voltei ao Brasil e nunca mais tive amizade.

Uma dessas pessoas a amizade se desfez ainda em Londres. 
Depois de tudo o que leram  - e mais que falta rs - essa pessoa sempre me aconselhava a voltar pro Brasil e até fazer o FCE aqui, o que era inviável pelo preço, a diferença pra quem estava recebendo em libra era gritante pra mim.

Ela sempre falava comigo e percebi o sumiço, depois de semanas, não era fácil lembrar de todo mundo quando se está com a cabeça a mil e tentando fazer as coisas darem certo mesmo dando murro em ponta de faca.
Resolvi mandar uma mensagem pra ela, dizendo que estava com saudades e ela me respondeu com um "saudade nada!". Fiquei tão arrasada... e perguntei: nossa, fulana, por quê?
E ela: "ah, eu também tenho meus momentos de solidão e o outro dia você disse a um amigo que ele..." não me lembro da situação exata agora, mas ela ficou com ciúmes de uma conversa no Fb com um amigo e, claro, ela entendeu errado achando que ele era querido e ela não...) e eu respondi que não era aquilo, expliquei a conversa em detalhes com esse amigo e disse e "você acha que tudo que eu vivo aqui é pouco?" Ela nunca mais respondeu, como não respondeu nem quando voltei ao Brasil, a deletei dos meus amigos, não quer falar, não fala e também não xereta minha vida...

Resolvi falar sobre isso hoje porque a vi no metrô.
Estava sentada do lado da moça da janela... e só vi quando uma moça entrou correndo no vagão indo para o fundo, de costas a reconheci e fiquei olhando onde ela sentaria: lá no último lugar, de cabeça baixa e eu olhando pra ver se era ela mesma, era ela. Ela não olhava, quando desci, passei, pela plataforma, olhando exatamente onde ela estava sentada, ela estava lá, olhando pra mochila, não olhou e eu fui.
Ela me viu, ninguém entra no metrô correndo em sentido contrário ao que eu estava pra sentar, com tantos lugares sobrando, justamente do lado de uma pessoa lá no fundo - se o banco estive vazio era outra história... - ela me viu quando o trem parava na plataforma e como era ali a porta que ela entraria, entrou correndo para sentar longe.

Tudo bem, se ela não tivesse feito isso poderia ter dado um oi pra ela e ver o que acontecia, mas nestas condições eu só tive certeza de uma coisa, uma teoria que tenho há muito tempo: quando a pessoa mal te conhece e já te chama de melhor amiga e diz coisas como "amo-te, amiga!" é porque é fogo de palha: como te ama num dia e foge de você no outro.

sexta-feira, 16 de janeiro de 2015

Quem está certo? Eu vivi um lado da história...

Como muito tem-se falado do caso do atentado em Paris à revista Charlie Hebdo, acho que devo escrever sobre  o que eu via, não estou generalizando, só contando histórias do que vi e ouvi por mais de uma pessoa em Londres.

Acho que também posso de vez em quando escrever sobre essas coisas... sempre surgem assuntos, eu é que sou preguiçosa, esqueço e passa o tempo certo pro comentário ou a falta de tempo consome o momento certo.

Londres é uma cidade que parece uma Torre de Babel.
Logo que me mudei pra lá, achava fascinante esse mix de línguas por todo o canto, pensava até em estudos linguísticos sobre isso... no final, não aguentava mais ouvir aquelas línguas loucas por todo canto... enjoei, estava irritada com tudo.

Com as línguas diferentes, vêm os costumes diferentes e me lembro muito bem da primeira vez que me assustei com uma muçulmana de burca: estava num ponto de ônibus, olhando as informações das linhas e tinha escurecido quando viro, tomo um susto dos grandes: pensei ver uma alma penada, mas era uma mulher de burca preta. Imaginem: local escuro, sozinha no ponto, me viro e dou de cara com uma forma de pessoa, mas que não se percebe ser mesmo uma pessoa dentro daquela roupa - que algumas usam até com uma "cortininha" nos olhos, não sei como não têm problema de visão essas moças...

Aos poucos me acostumei, mas o susto foi grande rsrs
Acostumei também em ver várias mulheres com crianças e apenas um homem com elas, mas não me acostumei com os (não vou dizer o país pra não ser tachada de racista ou xenófoba) fulanos de tal país dando em cima das ocidentais como se fôssemos prostitutas, mexendo de forma ofensiva porque se andava com qualquer roupa que para eles não é de "mulher temente a Deus".
Não me acostumava com o fato de entrar em uma loja deles e eles se sentirem no direito de perguntarem tudo que podiam sobre nossa vida - pra ver se conseguiriam algo - perguntavam se éramos solteiras, se morávamos ali perto, se morávamos com alguém, que éramos bonitas... sempre de um modo bem, digamos, primitivo. Um jeito de deixar com que nos sentíssemos um objeto ali exposto e eles estivessem barganhando o preço.

Assim como pessoas que conheci e viajavam para este países achavam graça de que o cara oferecia camelo e carros pelas esposas - sim, brasileiro acha graça e até pensa a respeito...

Uma das tantas vezes que estudava no Hyde Park (lá ou no Saint James porque era pertinho do Império do Fado) dois caras de um país desses vieram me importunar nos meus estudos. Disseram que trabalhavam com tapeçaria em Londres e queriam saber por que eu estudava no parque (acho que o parque é público, não?) .
Bem, boba que fui e disse que estudava para uma prova e um certificado de língua e aí começaram as perguntas: de onde eu era, se meu pai me sustentava, se eu ganhava bem no Brasil - olha só... tudo pra saber se eu era um bom partido pra darem o golpe do marido e serem levados pro Brasil. Eram primos e um era mais insistente que o outro que falava por que eu não tirava meu óculos escuros (porque estava sol e eu nem reparava mais que estava com ele), ele queria ver melhor meu rosto e, enquanto eu dizia que estava estudando, ele queria que eu fosse andar com eles (ah, tá...) e insistia e eu dizia que não. Ele queria porque queria que parasse de estudar e desse atenção a ele e eu me irritando. O primo disse para ele parar e me deixar, ele ainda insistiu um pouco mais, mas decidiu ir com o primo.
Eu esperei que eles estavam longe e fui para o lado oposto ao deles, com mais gente para continuar a estudar.

Também conheci uma brasileira casada com um deles, tinha dois filhos já. Ela tinha inglês fluente, vários cursos, faculdade lá, mas se mantinha em casa cuidando dos filhos e se sentia extremamente sozinha, queria que eu fosse babá dela - mas o marido não queria pagar nada - porque ela dizia que eu poderia bater papo com ela e assistir filme com ela e as crianças.
Percebi a frustração e a solidão... se a culpa é da origem do marido, não posso dizer, isso poderia acontecer em qualquer lugar, o fato é que eu pensei exatamente na vida dela quando o cara do mesmo país tentava me comprar ou ser adotado pelo meu pai rsrs (coitado rs).

Bem, mas isso não parece motivo suficiente para eu falar mal deles, né?
Claro que não, mas que são invasivos, são.
Assim como os que corriam com chaveiros da Torre Eiffel atrás de mim e diziam que nunca tinham namorado uma brasileira (agora entendem um pouco da minha aversão à Paris rs)...

Também vi um casal de mais idade que a mulher sentou-se num lugar na frente do ônibus, o marido falava na língua deles e gritava com ela como um louco, ela, com vergonha, levantou-se, foi sentar-se mais ao fundo e ele sentou no lugar.

Mas grave, grave mesmo e acho que é o que muitos europeus reclamam é como essas pessoas "tomam conta" do local onde vivem. Tomam conta mesmo, como se fosse um Estado deles, não um bairro, uma rua de Londres ou de qualquer outro país. Eles fazem suas próprias leis no país dos outros.
Há uma região londrina com uma comunidade bem expressiva, lá é proibido beber ou comprar bebida alcoólica, imagine beber na rua uma cerveja? Crime. Há placas pelas ruas e muros alertando de que ali é proibido e muitas pessoas têm medo de andar naquela região.

Exatamente neste local havia uma igreja católica que acabou por fechar: pelo medo dos habitantes ingleses dali de frequentarem e serem atacados (sim...).
Conheci o local depois de várias tentativas (por anos a fio) de um padre tentou restabelecer a comunidade, um padre brasileiro que, sabendo do número crescente de brasileiros católicos em Londres, pediu a ajuda do bispo inglês para reabrir a igreja. O bispo cedeu a igreja, estava fechada há anos, o problema seria lidar com a vizinhança que não aceitava outra religião que não a deles - e que chegou depois desta igreja - o padre e algumas pessoas aceitaram o desafio.
Jogavam pedras neles, ameaçavam e até defecavam na frente da igreja para dizer: esse bairro é nosso, é nosso Estado aqui e não se professa o Cristianismo... é nossa pequena Ditadura.

Padre e ajudantes não desistiram e conseguiram se manter lá e a igreja, quando estive lá em 2011, ganhou como padroeira Nossa Senhora de Aparecida, para ser uma comunidade brasileira aberta a todos. Vi algumas inglesas frequentando e elas olhavam com surpresa a cantoria e alegria da missa, bem no dia da santa, percebi pelos rostos delas que estavam felizes de ver aquela alegria.

Não pensem que isso quer dizer um final feliz, que venceram o fanatismo de outros, não. A missa da noite os brasileiros tinham medo de ir e todo mundo só vai embora em grupo, mas nada como conhecemos bem os brasileiros de fé, a luta vai continuar.

E só para não acharem que estou defendendo uma religião, digo que não sou católica, fui criada como, mas professo o Espiritismo que também já foi muito perseguido por quem mesmo?

Há muito que se pensar em questões de intolerância religiosa... um deixam de ter (ou fingem não ter) e outros começam a ter... há muito que se caminhar...